quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Um futuro (pouco) arquitectónico

O problema de não ser adulto e sufocar com a preocupação das contas no fim do mês e da comida no prato dos meus filhos, é ser adolescente e sufocar com o meu próprio futuro e com a preocupação de escolher um curso e, mais tarde, um trabalho, que me permita sequer ter filhos.
Sou, sem dúvida alguma, sortuda no meio desta crise que assalta (rapta?) o nosso país. Pergunto-me é por quanto tempo... De tudo o que a maldita tem roubado, espero que não me roube os sonhos. Ou melhor, a realização deles.
A minha aposta em arquitectura é forte desde os nove anos. Cinco, se contarmos com os primórdios de plantas que fazia no paint, sem saber muito bem o que era aquilo... não é que agora saiba! Há seis anos que respondia com muitas certezas à clássica pergunta "O que é que queres ser quando fores grande?"; mas a ladainha mudou: de há um ano para cá, a minha resposta passou a dividir-se em duas fases "Eu quero arquitectura, mas.... estou a apostar numa matemática qualquer". Claro que sem o desdém com que isto soa: eu adoro matemática. Direccionei a minha vida toda para que chegasse a arquitectura com várias noções, do mesmo modo que tentei abrir diferentes caminhos, com... a matemática. Esta sempre foi um porto seguro na minha vida académica e espero que assim continue.
Várias são as pessoas a dar opinião sobre o meu futuro, tantas, que me baralham: "Segue sempre o teu sonho!", "Arquitectura não é uma boa aposta", "Faz o que gostas", "Logo decides, tens tanto tempo", "Vai para fora", "Se calhar quando acabares o curso as coisas tenham mudado e possas exercer", "Usa o dinheiro do curso para viajar pelo Mundo", "A vida lá fora é terrível, faz o impossível, e escolhe o que gostas para exerceres cá em Portugal!",  "Matemática também não tem trabalho", "Arquitectura é tão versátil... podes ser professora e tudo!" e, ainda pior, "Vai para Angola".
Começo a juntar coragem (e não só) para ir para fora realizar sonhos daqui. O estirador do meu irmão espera por mim na arrecadação, há tanto, tanto tempo e as minhas próprias expectativas continuam cá dentro, tal como as de toda a gente e eu só penso o quanto o meu futuro me assusta, tal como o facto de não saber o que fazer agora para chegar lá mais segura.
E arquitectura sempre pronta a quebrar-me o coração.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Tiago Bettencourt

Queria partilhar com quem quer que por aqui ande o meu amor pelo Tiago Bettencourt.
Gostava até de explicá-lo, mas não consigo.
Talvez seja a sua doce voz, ou a maneira como sabe explicar-me nos seus poemas; talvez o ritmo, talvez a calma, não sei.
O Tiago acerta, acerta sempre. O Tiago deixa tantas frases soltas por aqui na minha alma, inacabadas, tantas reticências, mas eu sei completá-las, sei percebê-las, sei senti-las.
O Tiago salva-me de tantas, quase todas, as tempestades. Afasta temporais e furacões com um sopro... talvez seja a sua voz doce.
O Tiago não sabe, mas o Tiago lê-me. E eu um dia gostava que o Tiago soubesse que ele é a folha crocante deitada no meu passeio, é o meu sol depois do nevoeiro. É um livro quente no meu jardim, é o rio no miradouro. Talvez seja a maneira como sabe explicar-me nos seus poemas.
O Tiago é tão grande, apesar de pequenino no seu cabelo escuro e desgrenhado e na sua barba espessa. E eu gosto tanto da grandeza do Tiago, dos bichos dele, e dos medos dele e dos amores.
Às vezes já acho que a esperança é uma coisa muito cara na vida, por isso evito-a, mas, a que eu tenho, deposito-a no Tiago e nos seus salvamentos da minha (c)alma e nas curas dos meus (des)amores.
Gostava de explicar, mas faltam-me as palavras, por isso deixo-vos a voz doce e um poema do Tiago:


O Tiago é o meu caminho de voltar.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Hermanos

Passam um, dois, três, quatro anos e eu amo-os.
Passam mil, milhões, infinitas lágrimas e eu amo-os. Mares de saudades, mas eu sei que nos alimenta um oceano de amor.
A pergunta inevitável que resulta da distância tão constante é: porquê? A vida assume sempre as culpas e resta-me o silêncio.
Mas eu conheço-os. Passem os milénios que passarem, sei o toque macio das mãos deles nas minhas e o cheiro que não muda. Sei o calor dos abraços e a felicidade só de olhá-los, só de os sentir presentes.
E as surpresas, como arranjam sempre maneira de vir numa altura inesperada e de me pôr a chorar de alegria.
Desde que eles foram embora que a minha vida deixou de ser a mesma, os domingos viveram-se então monótonos, os individuais encheram apenas parcialmente a mesa, em vez da toalha que indicava que a casa estaria cheia. Mesmo com o esforço da minha mãe para que ao menos os petiscos fossem os mesmos, comer os seus pratos elaborados na quase-solidão dos quatro não era mesma coisa.
Desde que foram embora, e das poucas vezes que os meus irmãos voltaram numa breve visita, para partir de novo, eu chorei. E uma coisa é certa: seja a despedida por uma quantidade de anos indefinida ou por uns breves meses, eu chorarei sempre. Porque levam sempre o bocadinho tão grande de mim que neles carregam, deixando-me um vazio grande no sítio onde era suposto estar o meu coração e um nó na garganta.
O que me importa é que estejam felizes, mas às vezes é inevitável não implorar a quem quer que me ouça que a felicidade deles pudesse morar ao lado da minha.
Passaram agora um, dois, três anos desde a última vez e eu amo-os. E não haverá um dia na minha vida que isso mude.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

«Não se pode morar nos olhos de um gato»

Memórias dispersas em papel reciclado, diz-me tu a realidade, conta-me o passado.
O mundo esqueceu a vida e a vida esqueceu o mundo, quem me dera que connosco fosse tão fácil quanto isso.
O futuro pesa-me nos ombros enquanto carrego o presente nos braços, rogando a qualquer deus só um bocadinho mais de força.
Só quero que saibas que sem ti, o destino é tão monótono quanto um filme mudo, o tempo respira-se pesado no escuro da casa que já foi o teu lar. Amar outrem parece-me tão impossível quanto desamar-te a ti e espero que percebas que este ciclo é mais infinito que aquele que mantém o sangue a correr-me nas veias.
Até esse queria que parasse, por vezes, quando me apercebo pela milionésima vez num único minuto, que nunca a vida vai poder trazer-te de volta. Às vezes penso, estupidamente, que se a morte é o único caminho até ti, então eu sigo-o com as minhas próprias pernas, rastejo, se for preciso. Mas tu disseste-me para ser forte, para ser independente. Até me rio contigo, como se eu pudesse ser totalmente independente... Como se tu não me tivesses prendido nesses olhos, para a eternidade e todo azul que a constrói. Como se eu pudesse esquecer-me de ti e todo o amor com que me enlaçaste as mãos, os pés, a alma, a mente, para nunca e em vida alguma poder viver sozinha. Esse amor que me aquece uns dias e me gela os pulmões noutro, que me impede de respirar, que me transborda pelos olhos... e os teus olhos. Como se eu alguma vez pudesse viver um segundo da minha vida sem pensar nesses olhos, navegar neles, tão cravados na minha pele depois de tanto me olharem,  tão cravados na minha mente, depois de tanto os amar.
«Não se pode morar nos olhos de um gato», disse-o bem. Agora que me tiraram o meu lar, eu passeio cega por uma casa escura, onde o ar se respira tão pesado como qualquer lugar que não tenha a tua luz.

Conta-me

E hoje, diz-me tu, quem fomos? Conta-me o que amámos.
E hoje, diz-me tu, quem somos? Conta-me em quem nos tornámos.
E hoje, diz-me tu, quem seremos? Conta-me se alguma vez realmente existimos.
É que foi numa sala como esta em que nascemos. É que será  longe daqui que morreremos.
E um dia disseste-me que não existem fantasmas, mas eu sou assombrada pelo que nesse dia mais tememos.
Está escuro. Está frio. Chove.
Não há futuro, o passado morreu. O presente ilude. Tu matas. Eu morro. Mas ainda respiro.
Diz-me tu: quem és?
Conta-me quem sou.